Como tudo começou

Como tudo começou

Março de 2016...

Durante anos diversos médicos diziam que as dificuldades que estavam aparecendo eram devido à idade, afinal ele já passara dos 70 há uns bons anos.

Começou com um engasgo aqui, outro ali, saliva se juntando no canto da boca. A letra começou a ficar menos regular na hora de escrever e as palavras às vezes se atrapalhavam na mente ou na ponta da língua. As alterações no sono eram a regra, o cansaço repentino se tornava cada vez mais presente e o que antes era teimosia foi se transformando numa grande recusa em negociar, em não abrir mão do seu jeito de fazer as coisas.

Os passos foram ficando mais curtos e arrastados, causando tropeços, enquanto as mãos estavam sempre ocupadas em segurar alguma coisa ou nos bolsos caso contrário tendiam a um leve tremor, mas nada muito significativo.

Ele já estava com 83 anos quando de repente parou, como se tivesse sido retirado da tomada, causando pânico na esposa que em vão tentava ajudá-lo a se levantar da cama.

Hospital, apreensão e espera por um tempo que parecia infinito. Quando chegou sua vez, a médica, que toda vez prestara atenção todo o tempo naquele senhor sentado numa cadeira de rodas em frente ao consultório, já tinha uma boa ideia do que estava acontecendo.

O veredicto, Doença de Parkinson, caiu feito uma bomba mas iluminou todo o caminho até chegar aqui.

Neurologista, exames, medicação e terapia multiprofissional, ele que até agora era autônomo e dono das próprias vontades não tinha mais o controle da situação. Estava cercado de gente por todos os lados, invadindo sua vida outrora pacata, sua liberdade e sua privacidade, isso derrubou mais ainda sua energia.

Mais remédios, mais terapias e menos controle a cada mês, cada semana, cada dia...

Não podíamos ver tudo isso e ficarmos parados, tão impotentes quanto ele, assistindo aquele homem, que até agora trabalhara de sol a sol com uma enxada na mão, cultivando sua horta, cuidando do pomar e dos cães e aproveitando a vida do seu jeito, perder tudo o que lhe fazia levantar a cada manhã.

Tudo o que encontrávamos, textos e vídeos de profissionais experientes, falavam a mesma coisa que experimentávamos no dia-a-dia. Digo experimentávamos porque toda a família estava envolvida nessa nova realidade como cuidadores carinhosos e muitas vezes superprotetores.

Então, de repente, ele parou como se o chão lhe agarrasse os pés com uma força tão grande que não havia esforço que ele fizesse que o livrasse daquele desespero e quanto mais angustiado mais preso ele ficava.

Mais médico, mais exames, mais remédios e mais leitura, desta vez uma pesquisa direcionada e profissional. Por fim encontramos a iniciativa de um neurologista norte americano para interromper o tal Freezing.

Inspirados nessa proposta e certos de que podíamos melhorá-la desenhamos, fizemos protótipos que se mostravam cada dia mais eficientes, observamos sua evolução, seu ganho de mobilidade, autonomia e autoestima. Animados com os resultados chegamos ao modelo atual, batizado como Bengala 4.0, que levamos a todas as pessoas com problemas de marcha, independente de sua origem ser somática ou neurológica. Doença de Parkinson, Acidentes Vasculares Cerebrais, Paralisia Cerebral, amputações, protetizações, imobilizações prolongadas e tantas outras condições alteram o que convencionou-se chamar Marcha Funcional e o nosso compromisso é com todas as pessoas direta ou indiretamente impactadas por elas.

Nós vivemos esse dia-a-dia, conhecemos suas dores e esperanças e queremos lutar junto com você para fazer deste mundo, agora também nosso, um mundo melhor.